domingo, 15 de março de 2009

Os Sonhos

Não, não vamos entrar no mérito de A interpretação dos sonhos, muito menos abordar assuntos exclusivos para quem é da área psicanalítica, linha freudiana!
Vamos falar de sonhos mais parecidos com aqueles de Martin Luther King. Quem não se lembra de seu famoso discurso: Eu tenho um sonho...
Como professora, tenho falado com meus alunos da importância de ter sonhos e parafraseando o psiquiatra Augusto Cury, costumo escrever no quadro para eles copiarem a seguinte frase em português e inglês (sou professora de inglês, no Ensino Médio):
Os sonhos não determinam o lugar onde vamos chegar, mas eles produzem a energia necessária para tirar-nos de onde estamos agora.
Alguns manifestam entusiasmo com a frase e até aplaudem!
O fato é que desde 2007, nós, professores na EE Francisco Bernardino, Juiz de Fora, temos visto os sonhos moverem pessoas de um modo muito especial. É que desde 2007 recebemos alunos um pouco mais velhos para a turma do EJA (Educação para Jovens e Adultos).
São muitas histórias de vida que tivemos e estamos tendo o privilégio de fazer parte e aprender com todos! Da primeira turma, me lembro com mais facilidade do Junior. Um líder nato! Como evangélico, da igreja adventista, tentou com sinceridade e empenho evangelizar a todos nós! Engraçado! Não consigo me lembrar do seu primeiro nome, só sei que ele preferia ser chamado de Júnior simplesmente. Às vezes ele levava uma parte da prole, pois é pai de seis filhas e um filho! Júnior foi um excelente aluno e concluiu o Ensino Médio com seus colegas em 2008.
Ainda dessa primeira turma, preciso mencionar a Kátia Cilene. Não tendo com quem deixar o filho, de oito anos de idade, ela trazia o garoto todos os dias. O menino logo tomou gosto pela bola e não perdia uma partida jogando com os “marmanjões” do Segundo Grau. O resultado foi um braço quebrado...
A formatura, em dezembro de 2008, foi memorável!

Da esquerda para a direita: fileira de trás: Kátia Cilene, Profª Neiva (Inglês), Profª Bete (vice-diretora), Prof. Wanderson (matemática, Prof. Luciano (história), Rita, Wellington, Roberto Carlos,Prof. Magno e Júnior; fileira da frente: Profª Juliana (biologia), Vera Lúcia, Débora, Vera Eduarda, Profª Flávia (português).


Profesores e alunos improvisaram um cerimonial para a entrega dos diplomas:




Os comes e bebes não podiam ficar de fora na comemoração!


Professora e alunas: carinho e amizade...


Com carinho, vamos lembrar de todos dessa primeira turma:
Aldacir Ferreira Júnior
Alexandre Amauri de Souza
Dangelo da Silva Cravato
David E. Ferreira
Débora de Freitas Ferreira
Katia Cilene Vieira
Rita Aparecida C. Marques
Roberto Carlos da Silva
Vera Eduarda M. do Amaral
Vera Lucia Corbelli de Oliveira
Wellington Ribeiro da Silva
A segunda turma que começou em 2008, manteve as mesmas características da primeira, alunos cuja idade varia de 18 a 52 anos, todos com muitos sonhos e vontade de recuperar o tempo perdido. Como dizia a Andréia, “voltei a estudar por acreditar em mim”; ou Maria Eva que foi colega do seu filho na 8ª série e agora, no Segundo Grau, acredita que Deus tem algo especial preparado para ela, lá na frente. Sebastião quer ser professor de Educação Física; Silvana, uma veterinária. Juscilene, Wivian e Fernanda esperam conseguir um emprego melhor com mais estudos. Luiz Henrique finalmente pôde retornar à escola, agora que tem um pouco mais de tempo e pondera, “o mercado de trabalho está muito exigente, quero ver as coisas de outro ângulo, pois com estudo, você pode se capacitar melhor”. Almerinda que às vezes levava a netinha junto com ela para a sala de aula, está muito orgulhosa de voltar aos estudos e almeja fazer uma Faculdade. Mas estes são apenas alguns exemplos de sonhos que estão movendo as pessoas e tirando-as do lugar onde estão.



Gostaria ainda de registrar um aluno especial que entrou na primeira turma do EJA, mas não pôde continuar e infelizmente perdemos o contato com ele. Uoleston é o seu nome. Ele faltava às aulas com freqüência. Então fiquei sabendo que ele fazia hemodiálise. Uoleston se destacava pelo interesse, rapidez em aprender e simpatia. Um dia ele mesmo me contou parte de sua história. Ainda muito jovem entrou para a Marinha e como parte da tripulação num submarino, teve a oportunidade de conhecer muitos lugares do mundo. Esteve no Egito e pôde ver as famosas pirâmides. Mas, num fatídico dia, nas proximidades da costa norueguesa, o organismo de Uoleston não suportou mais a pressão que a profundidade marítima exercia sobre seu organismo e passou muito mal. Alguns diziam que ele estava tendo um infarto e ia morrer, mas foram os seus rins que entraram em falência, talvez devido às alterações da pressão arterial. Uoleston recebeu tratamento e ganha pensão da Marinha. Um dia, ele se queixou de dores nos pés e nas pernas. Ainda pensamos, pode ser esporão no pé, “se for mesmo, eu posso lhe emprestar uma calcanheira de silicone que usei durante um tempo, quando tive isso”, disse eu. Depois disso Uoleston sumiu, até que um dia apareceu na porta da sala, ainda com os pés no corredor, apenas a cabeça um pouco inclinada para dentro, “professora, a senhora acha que ainda tenho chance de passar de ano?” Então, já dentro da sala, ele nos contou o que de fato aconteceu. Ele estava com osteodristrofia. “Nossa! O que é isso? Como aconteceu?” Todos queriam saber. Então ele explicou que a hemodiálise não filtra o fósforo porque ele se esconde atrás de moléculas de metais pesados como o magnésio e alumínio. Então o fósforo fica circulando no sangue e estimula a glândula paratireóide a produzir o pth. O pth rouba o cálcio dos ossos e o deposita nas artérias e músculos. Os ossos vão ficando fininhos e fracos... Como pôde chegar a esse ponto, será que uma pessoa que faz hemodiálise não deveria receber mais atenção e cuidados médicos??? Mas, para resumir a história, Uoleston estava tomando um remédio caríssimo (que felizmente a Marinha estava fornecendo), remédio este que “agarrava” o fósforo do organismo e o eliminava pelas fezes. Mas a solução seria uma cirurgia para retirada da glândula e isso ia exigir um longo preparo. Uoleston começou a freqüentar as aulas de novo, mas teve de interromper mais uma vez. Um dia fui até a sua casa visitá-lo e levei uma dúzia de apostilas do cursinho pré-vestibular que meus meninos tinham usado e que lhe poderiam ser úteis. Então ele me falou do seu sonho. Um dia, ele queria ficar bom, estudar, exercer uma boa profissão, ganhar seu dinheiro e dispensar aquela pensão da Marinha... “Você vai conseguir, tem todas as chances que sua inteligência lhe permite!” Depois de um longo período sem notícias, nenhum contato mais foi possível...
Que Deus lhe permita realizar seus sonhos, Uoleston, e de todos os seus colegas que lutam para sair de onde estão!